O governo Jair Bolsonaro distorceu neste domingo, dia 6, a reportagem de capa da revista inglesa The Economist, que trata da pandemia no Brasil, e acusou a revista de sugerir o assassinato do presidente para superar a crise. Para desqualificar a publicação, uma das de maior prestígio internacional, o Palácio do Planalto atribuiu à revista uma suposta tentativa de “interferir em nossas questões domésticas” e de fazer apologia a um golpe das Forças Armadas contra Bolsonaro.
A Secretaria Especial de Comunicação Social (Secom) fez uma série de 23 postagens no Twitter distorcendo o conteúdo da reportagem “É hora de ir embora”, cuja tradução foi publicada pelo Estadão. O governo não divulgou nota a respeito, apenas postou a série de mensagens na rede social.
A Secom rebateu a reportagem, cuja capa traz uma ilustração com Cristo Redentor “respirando” auxílio de um cilindro de oxigênio, o que remete a capas feitas em governos anteriores sobre o Brasil.
A Secom afirmou: “A narrativa do texto, em suma, é a seguinte: o presidente seria um ditador que estaria matando o próprio povo; seus apoiadores estariam dispostos à guerra civil e o Exército estaria disposto a intervir caso o presidente perca as próximas eleições. Segundo a tradução replicada pelo Estadão, aqui utilizada, The Economist chega a afirmar que a solução seria eliminar o presidente: ‘A prioridade mais urgente é eliminá-lo’, afirmam. Vejam bem: não falam apenas em vencer nas urnas, superar, destituir. Falam em eliminar. Estaria o artigo fazendo uma assustadora apologia ao homicídio do presidente?”.
“Em 31 de março, aniversário do golpe militar, seis potenciais adversários de Bolsonaro assinaram um manifesto dizendo que a democracia estava ‘ameaçada’. Salvá-la exigirá mais do que manifestos. Os políticos precisam lidar com as reformas econômicas atrasadas. Os tribunais devem aplicar medidas severas contra a corrupção. E empresas, ONGs e brasileiros comuns devem protestar em favor da Amazônia e da Constituição. Mas será difícil mudar o curso do Brasil enquanto Bolsonaro for presidente. A prioridade mais urgente é eliminá-lo”, afirma a revista.
Nas publicações, a Secom desqualifica a reportagem, e afirma que o artigo é insano, não tem credibilidade e nem ética. O governo também afirma que a revista repete um discurso de viés histriônico e oposicionista, e teria, segundo a interpretação governista, o objetivo de influenciar os rumos políticos do Brasil, por isso, atentaria contra a “autonomia” do País.
“Sob o disfarce de crítica ao presidente, a The Economist ataca a nação brasileira”, afirma a Secom. “Ao mesmo tempo em que acusa o presidente de ser antidemocrático, conclama o Exército a insurgir-se contra seu chefe, em apologia a golpe antidemocrático”, afirmou a Secom.
O governo não detalha, em nenhum momento, dados para embasar seus argumentos e atrai para si iniciativas que não foram do presidente. Uma delas é a criação do auxílio emergencial, uma iniciativa do Congresso Nacional. A Secom também afirma que “Estados governados pela oposição incentivavam e festejavam o carnaval” no início da pandemia, omitindo que o presidente também viajou no feriado e sempre defendeu a retomada de atividades normais, contrariamente ao distanciamento social.
Em uma sequência de autoelogios sem dados, o Planalto também afirma que o governo Bolsonaro “investiu mais do que a média dos países emergentes no combate à covid”, “preservou milhões de vida” e que o País “está entre os cinco a garantir autossuficiência na produção de vacinas e é hoje um dos países que mais vacina sua população”.
O discurso se choca com a posição do Brasil em rankings internacionais, com a dificuldade de produção de vacinas em solo brasileiro – além de a demanda ser superior à oferta, ainda não há insumos que permitam autossuficiência e os laboratórios fabricantes dependem de importação.
Com 71 milhões de doses aplicadas, o Brasil está em quarto lugar no ranking total, mas é apenas o 66º na proporção de doses por 100 habitantes, que leva em conta o tamanho da população. Ao todo, o País superou a marca de 473 mil mortos pelo novo coronavírus, o segundo no mundo, estando entre os dez países com mais mortes por milhões de habitantes.